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Ayurveda, o que é?

Atualizado: 15 de fev. de 2023

Falar de Ayurveda é fácil e, ao mesmo tempo, complexo, pois envolve a quebra de mitos e crenças enraizados na visão ocidental sobre este sistema de saúde. Por todo o “misticismo” envolto nas tradições e religiões indianas, muitas pessoas confundem o Ayurveda com religião ou práticas energéticas. Esse é um problema recorrente com tudo que é “importado” do oriente, e acaba romantizado ou mistificado para atender aos padrões ocidentais.


O Ayurveda é considerado, por alguns, o berço da Medicina. Difícil ter certeza, pois muito se perdeu no tempo, mas não há dúvidas de que é um sistema de saúde milenar, já que seus registros datam de cerca de 3.000 a.C. De acordo com os textos clássicos, entretanto, esse conhecimento seria muito mais antigo, pois foi transmitido à humanidade a partir de Brahma (considerado o deus criador do universo) e transmitido de forma oral (guru - aprendiz) por muitos anos.

Todo o conhecimento filosófico e científico do Ayurveda está sistematizado em obras clássicas, divididas em 2 grupos:

  1. Brhat trayi (grande trindade):

    1. Charaka Samhita: livro mais importante de toda a literatura clássica do Ayurveda.

    2. Sushuruta Samhita: conhecimentos na área da cirurgia.

    3. Ashtanga Hridayam: compilado didático dos outros textos, considerado o melhor para introdução ao conhecimento do Ayurveda.

  2. Laghu trayi (pequena trindade):

    1. Madhava Nidana: descrição de doenças.

    2. Sharamgadhara Samhita: diagnósticos e tratamentos de doenças.

    3. Bhavaprakash: receitas e formulações para tratamentos.

Mas, afinal, o que é Ayurveda?

  • AYU= vida

  • VEDA= ciência, conhecimento

Ayurveda é o conhecimento, a ciência da vida, e tem como principal objetivo a manutenção da saúde dos saudáveis, e a cura dos doentes.

  • De acordo com o Charaka, vida (ayu) é a combinação de corpo (shareera), órgãos dos sentidos (indryias), mente (manas) e alma (atma).

  • Sushuruta define saúde como “sama dosha sama agni sama dhatu mala kriyaaha prasanna atma indriya manaha swastha iti abhidheeyate” - equilíbrio dos doshas, equilíbrio da digestão, equilíbrio dos tecidos, excreções adequadas, órgão dos sentidos, mente e alma em estado de contentamento.

Vamos conversar mais detalhadamente sobre os termos citados (doshas, agni, dhatu, mala) em outros textos, mas já deixo uma pequena introdução aqui, para que o assunto não fique muito vago:

  • Doshas são entidades fisiológicas que governam nosso organismo, sendo responsáveis por funções vitais; em desequilíbrio, são causadores de doenças, pois passam a exercer suas funções de forma errada, e viciam órgãos, tecidos, excretas, etc. Eles são vata, pitta e kapha.

  • Agni é nosso poder digestivo; não apenas a digestão do alimento que comemos, mas também os processos metabólicos nos tecidos, responsáveis pela manutenção da nutrição e do bom funcionamento do organismo.

  • Dhatus são os tecidos que constituem o corpo. Para o Ayurveda, existem 7 tecidos: rasa (plasma/linfa), rakta (sangue), mansa (músculo), medha (gordura), asthi (osso), majja (medula), shukra (fluidos reprodutivos).

  • Malas são nossas excreções, aquilo que precisa ser eliminado (urina, fezes, suor) para regularização das funções fisiológicas.

Portanto, a manutenção da saúde está diretamente relacionada com o equilíbrio das funções do corpo e da mente; e o tratamento das doenças só é possível a partir da identificação e correção dos desequilíbrios.

Ingênuo pensar que orientações e tratamentos do Ayurveda podem ser realizados “identificando meu dosha e meu desequilíbrio” através de testes padronizados, amplamente disponíveis na internet.


O bom profissional de Ayurveda realiza uma investigação detalhada do cliente/paciente. Além de serem abordadas as queixas e os sintomas, é realizada uma verdadeira investigação da rotina: hábitos de higiene, funcionamento do intestino, horários (de acordar, de comer, de dormir, etc.), trabalho, escolhas alimentares, hobbies, etc. O exame físico também é realizado, com observação de marcha e postura, da pele, dos cabelos, das unhas, de lesões, avaliação da língua, dentre outros. Essas informações são importantes para avaliar a potência do agni, a presença ou não de ama (“toxina”, alimento não digerido), a nutrição dos dhatus, a localização das alterações e os possíveis doshas envolvidos, um verdadeiro “quebra-cabeças” que aponta para a origem dos sintomas. Pode ser que, nesse processo, a prakrti (constituição, o que as pessoas costumam chamar de “meu dosha”) fique evidente, mas nem sempre é algo fácil de ser identificado no primeiro atendimento.


O tratamento é todo voltado para o reequilíbrio do corpo, através de organização de horários (resgate do ciclo circadiano fisiológico), ajuste alimentar (individualizado, não existe “dieta ayurvédica” padronizada), preparações à base de plantas e terapias corporais (as “massagens”). Habitualmente, as “massagens” não são orientadas logo no início do tratamento, pois é necessário que o cliente/paciente esteja apto para recebê-las, principalmente com agni estabilizado.


Ayurveda

As terapias corporais, ao contrário do que se pensa, não são “massagens relaxantes”, são tratamentos potentes, e com indicações precisas. Algumas são até bem desconfortáveis. A popularização desses procedimentos nos spas acabou desvirtuando um pouco suas finalidades; realizar, esporadicamente, uma massagem não é um grande problema; entretanto, algumas pessoas podem sentir-se desconfortáveis pelo “peso” dos óleos caso não estejam com boa digestão. E, como todo tratamento, elas também possuem contra-indicações.


Na Índia, também existem spas com “massagens ayurvédicas”, muito comuns em hotéis e regiões com muitos estrangeiros, mas não são vendidos como tratamentos e sim como uma experiência para turistas. Nos hospitais e clínicas, o cliente/paciente passa em consulta com um médico ayurveda (vaidya) e, quando indicadas, as terapias corporais são realizadas por assistentes (upasthatha).


Enquanto lá na Índia a formação do médico ocorre em universidades (BAMS - Bachelor of Ayurvedic Medicine and Surgery), aqui no Brasil o Ayurveda não é reconhecido como medicina ou sistema de saúde, e a formação de terapeutas se dá por meio de cursos livres, sem regulamentação específica. O Programa Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde do SUS (PNPIC) incluiu, em 2017, o Ayurveda em seu rol de terapias, porém, na prática, são raríssimas as unidades que realizam atendimento.


Agora que você entendeu melhor o que é Ayurveda, sua dimensão e complexidade, procure conhecer bem o profissional para realizar seu atendimento e tratamento, evitando padronizações simplistas baseadas em testes. Você é um ser único, e merece um tratamento individualizado.


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